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Por uma vida sem filas

Gosto de lugar vazio. Gosto de subir a Serra quando todo mundo está descendo. Gosto de praia quando tá chovendo. Gosto de Provença no inverno e Alpes Suíços no verão (essa parte é apenas pra dar efeito literário, já que nunca estive nos Alpes Suíços). Gosto de chegar quando todo mundo sai, de fazer check-out sozinha no canto do balcão, cumprimentando a enorme fila do check-in lá do outro lado. Gosto de esnobar o restaurante famoso, só para atravessar a rua e dar uma chance pro seu vizinho menos estrelado. E às vezes gosto do restaurante estrelado também, mas aí chego logo cedo e com reserva (e com reservas).

A verdade é que, aqui, com 30 anos na cara e 13 deles me saturando de São Paulo, quanto mais lugares famosos eu experimento, mais percebo que quanto mais falado, quanto maior a fila, mais chato vou achar. Às vezes vou achar chato porque a atração / a comida / a cidade não fez jus ao obaoba (uma simples questão de expectativas). Às vezes vou achar chato porque é ruim de fato, e aí eu me sinto o menininho do conto do Imperador Nu em meio às selfies e stories e hashtags produzidos ao meu redor. Às vezes, vou achar chato porque sou chata mesmo (quem sabe). Em todas as vezes vou achar chato porque muita gente junta, amontoada, acotovelada, me deixa insegura, irritada, sem paz. E na maioria das vezes, vou achar chato porque vai ser um passeio O-K – e apenas isso. E não vai rolar um perrengue engraçado, gostoso e inesquecível e não vai rolar um atendimento com mais atenção e não vai rolar algo realmente diferente. Vai rolar mais uma visita a um lugar de sucesso, sem charme e sem sossego. Fato é que amo conversar com o dono meio esquisito da padaria vazia e não tendo a gostar do atendimento falsamente polido do garçom descolado do sucesso do momento. É que o não-saturado me fascina, o cheio me desconvida.

É um jeito de viajar e é também um jeito de viver. Não é um jeito melhor que qualquer outro, já que o que é famoso muitas vezes chegou lá por mérito – e quem curte o cheio, a multidão e o famoso tem mais é que curtir essa sorte. Mas fugir da multidão é o meu jeito desde pequena. Já achei que isso era um problema e já achei que isso era algo muito especial e alternativo. Hoje, acho que isso sou eu e pronto. Curto conhecer o desconhecido, falar do pouco falado, achar o esquecido. E também ver o famoso, sim, o que sei que é bom fazer com a cabeça aberta. Mas aberta pra gostar ou não gostar, independente do que as hashtags dizem.

E nessa filosofia de vida e nessa filosofia de viagem me dou bem e me dou mal, mas invariavelmente me dou a chance de curtir o mundo à minha maneira. E nessa filosofia de vida e nessa filosofia de viagem o maior aprendizado é não morrer de FOMO, nesse mundo em que a sensação de medo de não conhecer “aquele lugar que todo mundo falou que PRECISO conhecer” ou de não ter minha versão da foto “daquela peça da exposição que todo mundo AMOU” é tão presente. Acredito que evitar filas desnecessárias na vida é um exercício de desapego, de diminuição da ansiedade. E de muita, muita liberdade.

Essa dupla de fotos, minha gente, representa a verdadeira essência do espírito anti-FOMO (não, não visitamos a Torre de Belém. E tá tudo bem).

Além do desapego e da baixa ansiedade, ser uma viajante sem fila nesse mundo envolve criatividade, bom humor e organização. É um tripé sucesso que permite:

Tirar aquela foto que todo mundo tira. Mas num ângulo novo.

Trocar a rota batida por uma rota inusitada. No caso, trocamos a batida rota dos vinhos pela menos conhecida e igualmente deliciosa rota dos chocolates (essa situação vale especialmente se você gostar mais de chocolates do que de vinhos, é claro).

Pegar as coisas (e o tempo) fechado quando seria muito mais legal se elas estivessem abertas. E aí? Aí é manter o bom humor e rumar para o próximo passeio. E lembrar que, em baixa temporada, o que está aberto é o não-turístico, ou seja, o que é realmente autêntico, com gente a fim de te atender, de conversar, te receber.

Curtindo a vista (?) na Escócia.
Linda a foto, né? No outro lado dela estava o castelo fechado.

É ser a única na foto e se sentir (feliz e sem sustos) numa cidade fantasma.

De vez em quando, é ficar no quarto do hotel comendo um lanchinho ruim porque nada abriu no domingo na cidade-fantasma onde você está.

É conhecer pontos turísticos inusitados, que não estão nas listas de “10 melhores coisas para conhecer em…”. Dica: a maioria deles você encontra sem querer pelo caminho.

O Hospital de Bonecas, o único lugar vazio em Lisboa.

 

Esse, meus amigos, é o verdadeiro grande ponto turístico da França!

Passando de carro numa estrada, marido fala “É UMA USINA NUCLEAR, VAMOS VISITAR!”. Visitamos.

Por fim, vale lembrar que viajar sem fila não é necessariamente só ir a lugares que ninguém vai. Mas é ir de um jeito diferente para o lugar que todo mundo vai. Na foto, a minha descoberta favorita da Torre Eiffel: descê-la a pé em vez de pegar (a fila e) o elevador é uma experiência sensacional.

E você? Que tipo de viajante você é? Na vida e na estrada.

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